domingo, 3 de fevereiro de 2008

A Vida Secreta das Palavras

imagem: Naked Young Man Sitting by the Sea, 1836 by Hippolyte Flandrin

“Everyday is like sunday
Everyday is silent and grey”

Morrissey, em Everyday is Like Sunday


Meu silêncio é amigo zeloso. Respeita nossa história como se fizesse reverência a coisas sagradas.

Meu silêncio destila mel sobre o amargo de nossas imperfeições, atribui peso de valor onde há uma medida vazia, apaga o cinza que seu coração manchou, sopra as cinzas da fogueira da sua vaidade. Meu silêncio promove meios de vida à nossa amizade.

Meu silêncio protege você de mim. Cala teu sussurro perto do meu olhar, evita o afago do rosto quando devo cumprimentá-la, escurece a respiração antes de nosso abraço, afasta o vento que desliza pelos fios dos seus cabelos, desvia o toque secreto dos lábios no momento da partida.

Meu silêncio pensa em você mais do que eu. Não me deixa insultá-la, não me permite a réplica veloz, me afasta do revide à suas calúnias infantis e mimos burgueses, me segura quando deveria espancá-la com as palavras mais ácidas, quando deveria cuspir no céu de nosso passado o quanto fiz sem nunca receber em troca o olhar de quem entende o significado do sacrifício.

Meu silêncio releva suas mentiras. Simula acreditar em todas as bebidas que acompanham suas fantasias e acepções. Meu silêncio revela o quanto o amor é submisso e covarde.

Meu silêncio passa a pé em frente a sua casa para encontrar no vazio da calma o arrependimento necessário para seguir adiante.

Meu silêncio contradiz a expectativa de eu não ser mais aquele que esteve ao seu lado. Meu silêncio é carregado de sons que nunca lhe abandonaram.

Meu silêncio faz sigilo comigo mesmo para que você não saiba o quanto nossas lembranças passadas refletem a memória do presente.

Meu silêncio é colchão de retalhos que absorve o impacto da nossa falta de intemperança.

Meu silêncio ampara meus dedos sobre as teclas do computador, reduz minha raiva, desacelera minha fúria, perdoa sua insanidade.

Meu silêncio seca as lágrimas de um domingo a tarde qualquer.

Meu silêncio é grito aprisionado no peito.

Meu silêncio é mais impetuoso que sua cólera.

Meu silêncio é fingimento para viver tão perto de você.

Meu silêncio não é abandono, é refúgio.

Jânio Dias

5 comentários:

Anônimo disse...

Uau! Jânio, o sumido, esteve em silêncio desde dezembro e fez muita falta.

O silêncio ajuda-nos a viver com sabedoria.

E o senhor continua com as metáforas...Parabéns!

Feliz 2008 pra ti também (nunca é tarde para se desejar um bom ano).

Beijos.

Anônimo disse...

Olá Amigo Jânio!
Senti muito sua falta durante todo esse tempo. Estava esperando completar 60 dias para te mandar um e-mail, ainda bem que não foi necessário.
Acho que depois de tantos anos não é preciso silenciar, né. Você voltou em grande estilo. Dá primeira até a última frase desse post.
Beijo!

Marly Pereira disse...

Oi, Janio!
Estou de volta a leitura do seu blog. De cara ja tive uma otima surpresa, lindo texto.
bj
Marly

Anônimo disse...

Poeta de todos os "Dias"!

Que saudade desse poeta, guardo boas lembranças de vc e de como fico indignada de ainda não ter encontrado algum livro seu por aí!! Espero que qdo lança-lo se lemre dessa amiga que admira seu trabalho e se encanta com as letras que escreve...

Bem, fazia muito tempo mesmo q não entrava na net e hj resolvi entrar e visitar seu blog, parabéns!

Beijos pra vc poeta predileto

ludearuja

Renata disse...

"O silêncio é um dos argumentos mais difíceis de refutar." -
Josh Billings

Fique quieto, mas fique bem!

lembra da senha 1, 2, 3, 4? Pois é, apesar de eu não usá-la mais ainda serve para vc! E A M V !!!! hehehe

bjs