sábado, 7 de março de 2009

Sim Sobre o Amor

imagem: cena da impressionante peça "Não Sobre o Amor", de Felipe Hirsch


“Drinking tea with the taste of the Thames
Sullenly on a chair on the pavement
Here you'll find
My thoughts and I
And here is the very last plea from my heart
My heart
Forevermore”

Morrissey, em Come Back To Camden


Se antes só, agora nem sei o que sentir.

Como explicar a você que quando lhe escrevo não são apenas meras palavras ao acaso que formam o desejo de querer estar ao seu lado? Como faço para que entendas que ao relatar a dor que me causa nossa distância, estou pedindo para que algum deus promova o milagre da aproximação de nossas moradas? Como posso mostrar-lhe que o exílio de seus olhos é como o nascimento de uma noite eterna sem amanhecer?

Estou proibido de falar sobre ele. Ela me proibiu. Não, ela não me pediu. Obrigou-me a não mais mencioná-lo em minhas linhas enviadas a ela. Ela só me recebe se eu não levá-lo comigo. Ela só me aceita se eu me desfaço dele. Ela só me rasga se eu não enviá-lo junto. Ela só me toca com seus dedos finos e alvos se eu não estiver vestido dele. Eu só posso estar com ela se ele não estiver mais comigo.

Mas sem ele sou vazio que enche o copo de ar que cega as lâminas da esperança.

Sem ele sou sede que arde as vias da garganta, que escurece o sol da boca e enrijece os lábios da doçura.

Sem ele sou água esparramada na terra que seca antes de ser bebida. Chuva que escorre deitada sem olhar de onde veio. Gota que não pesa para cair de sua folha.

Sem ele sou pingos que não se juntam.

Antes dele, antes que tomasse consciência de sua plenitude, de sua perfeição quanto ao estado de todas as coisas que nos cercam e nos dão forma, eu simplesmente não existia para mim mesmo. Eu não existia em mim, meus dedos e braços não tinham movimentos, meus joelhos não dobravam em minhas pernas, minha boca bocejava o sono da indiferença. Meu corpo não era matéria, minha alma não tinha intenções, minha índole era dispersa.

Antes dele as estrelas ainda não sorriam para mim.

Com ele sou parte de tudo que se move e agi. Interajo com os pássaros, dou comida aos gafanhotos, canto para os cisnes.

Com ele preencho as casas dos botões, pinto as unhas das luvas, laço com o cadarço ramos de sol.

Com ele acende-se em mim a chama que me desperta para o dia antes dos montes serem iluminados; que aquece o inverno de quando era criança; que incendeia a noite enquanto as sombras não vêm.

Com ele tenho alicerce para suportar arranhacéus em meus ombros.

Com ele sou vida e sonhos perto de você.

Você precisa entender que todas as palavras são sobre ele.

Todas as metáforas remetem a ele. Todos os adjetivos querem vesti-lo. Todos os espaços almejam cair em seu abismo. Todos os acentos anseiam sua ênfase. Todos os pontos esperam por sua continuação.

Todas as ruas se cruzam para segui-lo. Todas as curvas enrolam-se para deslizar em sua superfície. Todos os faróis noturnos querem suspendê-lo para vê-lo flutuar como pétalas levadas pelo vento e espalhadas no mar.

De dia os faróis descansam a amargura de desejos como o seu.

Todo choro e todo gozo são frutos e semente de seu domínio. Todo riso e todo calafrio são rompantes de seu surgimento. Toda angústia e toda calmaria são opostos que se alimentam de seus efeitos.

Toda loucura profunda é zelo com o objeto amado. Toda devoção é necessidade de amparo.

Ele é maior que sua recusa em me amar.

O que você não vê é que todas as saídas são fugas para encontrá-lo.

Jânio Dias

4 comentários:

Anônimo disse...

E essa estória me é bem familiar.

Acho que ela não vai resistir por muito tempo!

Beijos.

Anônimo disse...

oi, tudo bem?
continuo por aqui, de vez em quando:
http://gaitha.tumblr.com
bjão!

Anônimo disse...

oi, tudo bem?
continuo por aqui, de vez em quando:
http://gaitha.tumblr.com
bjão!

Luara Quaresma disse...

Voce me da arrepios *-*